segunda-feira, 31 de agosto de 2009

UMA CAMPANHA ALEGRE


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«Sois tão criminosos que nos fazeis perder o riso. E no entanto ele é a nossa vingança! E é indispensável que se mantenha sempre pronto, amargo, cruel, para que em nome da consciência ofendida vos vamos expondo, querendo Deus, trémulos e grotescos, ao escárnio da multidão.»

SOB O MANTO DIÁFANO DA SUPERFICIALIDADE


Carolina Patrocínio, apresentadora de programas galináceos (SIC), senhora de profundo pensamento aboboreiro que derrama generosamente nas páginas das revistas 'rosas', promotora de programas culturais como o 'Rock in Rio', mandatária socretina para a Juventude, discursou na 'rentrée' socretina. E, em prosa sem caroços nem grainhas que espraiou nas areias de Santa Cruz, disse-se encantada pelo fim da recessão técnica.
Aqui temos mais um exemplo de como, sob o manto diáfano da superficialidade, se escondem as preocupações da 'piquena' pelos grandes problemas da Humanidade. E, com tanta sintonia entre 'Mestre' e 'Discípula', daqui até ao dia 27 de Setembro, com paciência e perseverança, se escavarmos mais um pouco, ainda poderemos descobrir um doutoramento da vedeta em 'Economia de Batota' tirado na Universidade Independente (por fax, enviado pela empregada doméstica, evidentemente).

domingo, 30 de agosto de 2009

UMA CAMPANHA ALEGRE


«Nós bem o sabemos: a gargalhada nem é um raciocínio, nem um sentimento; não cria nada, destrói tudo, não responde por coisa alguma. E no entanto é o único comentário do mundo político em Portugal. Um Governo decreta? gargalhada. Reprime? gargalhada. Cai? gargalhada. E sempre esta política, liberal ou opressiva, terá em redor dela, sobre ela, envolvendo-a como a palpitação de asas de uma ave monstruosa, sempre, perpetuamente, vibrante e cruel - a gargalhada!
Política querida, sê o que quiseres, toma as tuas atitudes, pensa, ensina, discute, oprime - nós riremos.»

SURPRESA?


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Marcelo Rebelo de Sousa considerou as declarações de Pina Moura sobre o programa eleitoral do PSD «uma boa surpresa».
Surpresa? Onde estará a surpresa? O ex-socretino de hoje é o ex-cardeal guterrista de ontem, o ex-delfim cunhalista de anteontem e será o ex-manuelino de amanhã, quando os ventos voltarem a mudar.
Surpresa? Porquê surpresa se o figurante considera que a ética republicana é a lei e a lei não proibe o oportunismo, por mais abjecto que seja?
Surpresa? Oh, Marcelo, você disse «surpresa»?

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


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PINA MOURA DÁ APOIO A FERREIRA LEITE
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Com apenas três ou quatro adjectivos, Joaquim Pina Moura, ex-ministro socialista das Finanças e Economia e um rosto que já foi muito próximo de José Sócrates, surpreendeu tudo e todos ao revelar que o programa eleitoral do PSD é mais 'duro e focado' do que o do Partido Socialista (PS).
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CM

sábado, 29 de agosto de 2009

UMA CAMPANHA ALEGRE


«Há muitos anos que a política em Portugal apresenta este singular estado:
Doze ou quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o poder, perdem o poder, reconquistam o poder, trocam o poder...O poder não sai de uns certos grupos, como uma péla que quatro crianças, aos quatro cantos de uma sala, atiram umas às outras, pelo ar, num rumor de risos.
Quatro ou cinco daqueles homens estão no poder, esses homens são, segundo a opinião, e os dizeres de todos os outros que lá não estão - os corruptos, os esbanjadores da fazenda, a ruína do País!»

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

JORNAIS DE REFERÊNCIA




Ao sempre beneditino 'Diário de Notícias' (embora com 'nuances' salazarinas, marcelinas, gonçalvinas, soarinas, cavaquinas, socretinas, conforme o ocupante do palácio de S. Bento), junta-se, agora, o manuelino 'Público', sob a batuta do 'neocon' Fernandes, para servirem ao bom povo 'jornalismo de referência'.
E, fruto desse genuíno 'serviço público', aqui temos a promoção da vizinha Manuela em foto de estúdio de publicidade ( ou a isto chama-se 'foto-jornalismo'?) na primeira página do órgão oficioso do grupo Sonae.
Fernandes, o 'neocon' Fernandes, o emocionado Fernandes (a estátua de Saddam, lembram-se?), merece uma promoção. Promova-se o homenzinho a director do 'Povo Livre' para poder continuar o jornalismo de referência, já que, ao que consta, o 'Público', com a linha editorial do Fernandes, anda pelas ruas da amargura e há mesmo quem tema pela sua saúde.




UMA CAMPANHA ALEGRE


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«Ora, apesar desta nomeação aparatosa e de grave cerimonial, o deputado é tão igualmente funcionário como se fosse nomeado por oito linhas triviais e burocráticas do Diário do Governo. O deputado obedece ao Governo, e exerce uma função. Há o apagador, o gritador, o interruptor, o homem dos incidentes, o homem dos precedentes, etc. E quando desagrada, é demitido. Somente não se diz demitido. Diz-se, com menos asseio, dissolvido.»

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


quinta-feira, 27 de agosto de 2009

DE OUTROS


«O dr. Cavaco, sobre ser católico ( o que ninguém leva a mal), impede-se, por uma estreita visão do mundo, de compreender as novas relações sociais. Ele não descortina os sinais do tempo; e aqueles que dificultosamente se apercebe, fecha-os no círculo limitadíssimo das suas avaliações. Não se trata de birra; nem sequer, admito-o, acaso ingenuamente, de um braço-de-ferro com Sócrates e o PS. Com perdão da palavra, o homem é, manifestamente, reaccionário, pouco permeável à fluidez social e tende a recuperar velhas figuras de autoridade. É o pior Presidente da II República.»
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BAPTISTA-BASTOS
(DN)

UMA CAMPANHA ALEGRE


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«A Câmara não tem seriedade. Quem não viu uma sessão? O sussurro, o barulho, a confusão são perpétuos. Vota-se sem se saber o que se discutiu, e continua-se a conversar. As questões pessoais estão constantemente na ordem do dia. Voam os desmentidos. Fervilham as injúrias. Nos momentos mais serenos é a graçola e a troça. E das galerias o público assiste, ora indignado ora divertido, ao espectáculo sem igual.»

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


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«MARQUES MENDES DIZ QUE FALTA DE ÉTICA CORRÓI DEMOCRACIA.»
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«I»

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


UMA CAMPANHA ALEGRE


«A opinião tem pela Câmara dos Deputados um sentimento unânime e unanimemente declarado: o tédio.
Diz-se mal da Câmara por toda a parte. Os jornais mais sérios falam constantemente na sua improdutividade. Aparecem contra ela panfletos satíricos. Ela é geralmente considerada como um sórdido covil de intrigas. Se se pergunta:
- Que houve hoje na Câmara?
- Uma farsa - respondem uns.
- Uma feira - respondem outros.
Os jornais políticos vêm cheios destas fórmulas: «A Câmara ontem deu um espectáculo triste para quem preza os verdadeiros princípios...» «A Câmara está oferecendo a prova da sua falta de independência...» «A Câmara salta por cima dos princípios mais rudimentares da administração.»
- O parlamento é uma vergonha - diz-se nos cafés.
- Vamos aos touros! - exclama-se nas galerias (textual).
- Amanhã há escândalo! - murmura-se na véspera das sessões.
Fazem-se-lhe epigramas, põem-se-lhe alcunhas. Os folhetins escarnecem-na; os jornais de notícias contam com uma singeleza dramática: «Ontem a sessão passou-se em injúrias pessoais.»
Um grande escritor, que é também um grande carácter, chamou-lhe: «Lupanar!». O dito julgado justo, e coberto de aplausos, é sempre citado.»

terça-feira, 25 de agosto de 2009

OLHA A MALA


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Os partidos do bloco central de interesses vão gastar mais de 50 - CINQUENTA MILHÕES DE EUROS - 50 na campanha eleitoral para as autarquias.
É evidente que os fundos serão garantidos, nos termos da lei, pelos contribuintes, por cidadãos altruístas e por empresas com consciência social.
Extinga-se, pois, o departamento de Maria José Morgado!

UMA CAMPANHA ALEGRE



«Assim, por exemplo, a questão religiosa é complicada. Qual é o vosso princípio nesta questão?

- Economias! - disse com voz potente o partido reformista.

Espanto geral.

- Bem! E em moral?

- Economias! - bradou.

- Viva! E em educação?

- Economias! - roncou.

- Safa! E nas questões de trabalho?

- Economias! - mugiu.

- Apre! E em questões de jurisprudência?

- Economias! - rugiu.

- Santo Deus! E em questões de literatura, de arte?

- Economias! - uivou.

Havia em torno um terror. Aquilo não dizia mais nada. Fizeram-se novas experiências. Perguntaram-lhe:

- Que horas são?

- Economias! - rouquejou.

Todo o mundo tinha os cabelos em pé. Fez-se uma nova tentativa, mais doce.

- De quem gosta mais, do papá, ou da mamã?

- Economias! - bravejou.

Um suor frio humedecia as camisas. Interrogaram-no então sobre a tabuada, sobre a questão do Oriente...

- Economias! - gania.

Foi necessário reconhecer, com mágoa, que o partido reformista não tinha ideias. Possuía apenas uma palavra, aquela palavra que repetia sempre, a todo o propósito, sem a compreender.»

O BRANCO

Poema de geometria e de silêncio
Ângulos agudos e lisos
Entre duas linhas vive o branco.
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Sophia de Mello Breyner Andresen
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(Fotografia: Graça Serrão)

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

UM IMENSO ADEUS


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«sempre que o filho-da-puta especializado em fazer faz um acordo, é difícil saber se é um acordo público que traz vantagens particulares ou se é um acordo particular que traz desvantagens públicas, e o mesmo acontece sempre que ele, o filho-da-puta, faz todas as outras coisas que o filho-da-puta faz, as obras públicas feitas por motivos particulares, os programas de ensino público decretados com intenções particulares, as guerras públicas movidas para obter vantagens particulares, os jornais públicos para relatar sobretudo os interesses particulares, os estabelecimentos públicos para ocupações particulares, os medicamentos públicos para lucros particulares, em suma, os negócios públicos feitos para fins particulares e os negócios particulares feitos para fins públicos, e basta.»

O PERSPICAZ


Perestrello, o Marcos, de seu nome completo Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos, socialista moderno, socretino e tudo, camarada do ex-ministro do Ambiente J. Sousa, concorrente do ex-ministro do Ambiente Isaltino M., opinador num programa erótico da RTP chamado 'Corredor do Poder', colunista do 'Expresso', em espaço deixado vago pelo prof. Espada, aluno brilhante da escola socretina - elegante de fatos e falho de ideias - vem, agora e só agora, chamar a atenção de todos os portugueses para um pormenor, pequeno pormenor, aliás, que lhes escapou nestes últimos quatro anos: a senhora ministra da educação teve «uma atitude hostil que deu aos professores um pretexto mobilizador, acabando por transformar uma luta profissional numa luta também política». E Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos deixa um aviso à navegação: «Mas o grande desafio que se tem pela frente é o de encontrar uma nova forma de relacionamento recíproco entre o Ministério da Educação e os professores.»
Obrigado, Marcos. Obrigado da. Obrigado Cunha. Obrigado e. Obrigado Lorena. Obrigado Perestrello. Obrigado de. Obrigado Vasconcellos. Obrigado pela perspicácia. Obrigado pelo alerta. Este país ficou, finalmente, a saber que havia uns problemazitos entra a ministra Lurdes e os professores.
Os sindicatos dos professores devem, desde já, uma estátua a Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos, descobridor de problemas e povoador de soluções.

UMA CAMPANHA ALEGRE


«O homem, à medida que perde a virilidade de carácter, perde também a individualidade de pensamento. Depois, não tendo de formar o carácter, porque ele lhe é inútil e teria a todo o momento de o vergar -; não tendo de formar uma opinião, porque lhe seria incómoda e teria a todo o momento de a calar - costuma-se a viver sem carácter e sem opinião. Deixa de frequentar as ideias, perde o amor da rectidão. Cai na ignorância e na vileza.»

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


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«Os serviços secretos estão a celebrar protocolos com os organismos públicos com vista à colocação de agentes do Serviço de Informações da República (SIS) e do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) com identificação codificada em instituições do Estado.»
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CM

domingo, 23 de agosto de 2009

UMA CAMPANHA ALEGRE


«Serve-se, não quem se respeita, mas quem se vê no poder. Um governador civil dizia: - «É boa! dizem que sou sucessivamente regenerador, histórico. reformista!... Eu nunca quis ser senão - governador civil!». Este homem tinha razão, porque mudar do Sr. Fontes para o Sr Braamcamp não é mudar de partido -; ambos aqueles cavalheiros são monárquicos e constitucionais e católicos. A desgraça é que, se em Portugal existissem partidos republicanos, monárquicos, socialistas, aquele homem, assim como fora sucessivamente reformista, histórico e regenerador - isto é, as coisas mais iguais - seria republicano, monárquico e socialista - isto é, as coisas mais contraditórias.»

sábado, 22 de agosto de 2009

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


«Temos um excelente Presidente da República, deputados muito bons e pessoas muito decentes no governo.»
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DUARTE NUNO DE BRAGANÇA
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('I')

UMA BOA OPORTUNIDADE


«Toda a Nação vive do Estado. Logo desde os primeiros exames no liceu, a mocidade vê nele o seu repouso e a garantia do seu futuro. A classe eclesiástica já não é recrutada pelo impulso de uma crença; é uma multidão desocupada que quer viver à custa do Estado. A vida militar não é uma carreira; é uma ociosidade organizada por conta do Estado. Os proprietários procuram viver à custa do Estado, vindo ser deputados a 2$500 réis por dia. A própria indústria faz-se proteccionar pelo Estado e trabalha sobretudo em vista do Estado. A imprensa até certo ponto vive também do Estado. A ciência depende do Estado. O Estado é a esperança das famílias pobres e das casas arruinadas. Ora como o Estado, pobre, paga pobremente, e ninguém se pode libertar da sua tutela para ir para a indústria ou para o comércio, esta situação perpetua-se de pais a filhos como uma fatalidade.»

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

UM IMENSO ADEUS


«O socialismo, quando chega ao exercício da governação, constitui uma enorme força de atracção para as naturezas parasitárias. Mas isto passa-se também em níveis mais restritos. Sempre que houver cooperativas, montepios ou caixas económicas nas mãos dos operários, e que tais actividades forneçam aos intelectuais uma subsistência garantida e posições influentes, então é certo que estará à espreita uma camada de socialistas comerciantes, sem verdadeiros conhecimentos do socialismo e sem real amor à causa. Como sempre e em todas as coisas, também na democracia o êxito é sinónimo da morte do idealismo.»

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


«A investigação judicial ao caso Freeport descobriu depósitos de 200 mil euros, em 2002, nas contas bancárias de Carlos Guerra, ex-presidente do Instituto de Conservação da Natureza, então dependente do ministro do Ambiente, José Sócrates.»
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SOL

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


«Pacheco Pereira tinha prometido falar sobre a polémica das listas de candidatos do partido às legislativas e cumpriu. No blogue Jamais lança a pergunta - 'Há erros, mesmo erros graves?' - e responde: 'Certamente que há'. Admite, aliás, que ele próprio teve que 'engolir sapos', mas sustenta que é preciso salvar o País do 'desastre nacional' que seria um novo mandato de José Sócrates. O que não o inibe de considerar António Preto 'uma ferida em aberto nas listas do PSD'.»
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DN

O FIM DA CRISE


Segundo um ex-ministro das finanças, a grande diferença entre os futebolistas e os economistas está em que os primeiros são capazes de fazer prognósticos depois dos jogos e os segundos nem isso.
E, assim, olho para a economia real sem ter em conta os números do INE, as análises do BCE, as previsões do FED, os estudos do BP, os pessimismos do FMI, as estratégias do Banco Mundial, as fanfarronices do ministro Pinho, o vácuo do cabide que está em Presidente do Conselho.
No entanto, estou em condições de anunciar ao mundo que, em Portugal, a crise acabou. E tenho provas: o Benfica ganhou 4 - 0.

UMA CAMPANHA ALEGRE


«O Sr Fulano, feito presidente de ministros, vai à Câmara.
Ao outro dia dizem os jornais ministeriais: «O nobre Presidente do Conselho tinha ontem, à sua entrada na Câmara, umas magníficas botas de pelica. Que admirável pelica! Só quando se tem como S. Exª. um tão grande zelo pelo bem do País e uma tão alta experiência das coisas públicas, se pode encontrar uma tão boa pelica!»
Os jornais moderados, em expectativa, em meia oposição, declaram: - «Não somos aduladores do poder, dizemos-lhe em face a verdade. Conhecemos a longa experiência, os fortes dotes oratórios do Sr. Presidente do Conselho; mas, apesar do seu tacto político, S. Exª. tinha simplesmente umas botas moderadas de vitela francesa.»
Os jornais da oposição exclamam:
«Insensatos! Que vindes vós falar na experiência, nas virtudes cívicas do Sr. Presidente do Conselho? S. Exª. é ominoso! Não! As suas botas não são de vitela francesa, como quer uma oposição refalsada, como quer uma maioria venal. As suas botas demonstram que caminhamos para a anarquia e são de couro de Salvaterra!»

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


«O especialista em ambiente escolhido para apoiar a equipa que investiga o caso Freeport suscitou críticas internas no Ministério Público. Manuel Duarte Pinheiro tem no currículo uma extensa lista de colaborações com organismos do governo. Professor do Instituto Superior Técnico e director-geral de uma empresa que trabalha em estudos de impacto ambiental, auditorias e acções de formação, participou, designadamente, no programa Polis quando o primeiro-ministro tutelava a pasta do Ambiente.»

UM IMENSO ADEUS


DE UM AMOR MORTO
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De um amor morto fica
Um pesado tempo quotidiano
Onde os gestos se esbarram
Ao longo do ano
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De um amor morto não fica
Nenhuma memória
O passado se rende
O presente o devora
E os navios do tempo
Agudos e lentos
O levam embora
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Pois um amor morto não deixa
Em nós seu retrato
De infinita demora
É apenas um facto
Que a eternidade ignora

UMA CAMPANHA ALEGRE


«E não obstante, como tudo parece feliz e repousado! Os jornais conversam baixinho e devagar uns com os outros. O parlamento ressona. O ministério, todo encolhido, diz aos partidos - chuta! As secretarias cruzam os braços. O tribunal de contas, lá no seu cantinho, para se entreter, maneja sorrindo as quatro espécies. A polícia, torcendo os bigodes, galanteia as cozinheiras. O conselho de Estado rói as unhas. O exército toca guitarra. A câmara municipal mata em sossego os cães vadios. As árvores do Rossio enchem-se de folhas. Os fundos descem, e descem há tanto tempo que devem estar no centro da Terra. O povo, coitado, lá vai morrendo de fome como pode. Nós fazemos os nossos livrinhos. Deus faz a sua Primavera... Viva a Carta!»

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


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«O presidente da Câmara de Santarém, Moita Flores, vai atribuir a medalha de ouro da cidade a José Sócrates».
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CM

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

UM IMENSO ADEUS


«Fomos um dia, ao fim da manhã, à Grãfina. Uma pastelaria, uma pastelaria fina. E tu gostavas da expressão fina, pastelaria fina. Fabrico próprio. E eu falei-te de outros tempos, mas sem grandes saudades, como se estivesse eu própria a refazer o guião de um filme por pura e simples curiosidade. Já lá não estavam, àquela hora, os meus actores, e tinham-se mudado, eu também, ou a vida por mim, tinha virado radicalmente uma página do cenário. Tomava-se aqui o pequeno-almoço, antes das aulas, os que moravam por perto, e eram muitos. Eu às vezes passava, saía em Entrecampos, tomava café com eles. Chegavam entretanto cansados os noctívagos, davam-se dois dedos de conversa. Resistentes, sorri, desacreditando o que tinha dito. Voltava-se mais tarde. Quem eram? Eram muitos, éramos estudantes, havia até futuros actores e políticos. Era aqui perto «O Tempo e o Modo». Discutia-se muito. Gente de esquerda e ao canto os bufos, os que eram e os que pareciam ser. E um poeta, um grande poeta. Lembro-me de um que havia de dar que falar. Entrava mudo e passava calado e escrevia, escrevia sozinho poemas no meio da maior turbulência, como se nada fosse. Um dia vi-o sair cabisbaixo. Então?, perguntei-lhe. Vou para casa, aqui já não tenho ninguém com quem falar, disse ele, que mal abria a boca e ensimesmado no meio das hostes redigia o poema que, assertivo, nos lia ao fim.»

UMA CAMPANHA ALEGRE


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«E assim se passa, defronte de um público enojado e indiferente, esta grande farsa que se chama a intriga constitucional. Os lustres estão acesos. Mas o espectador, o País nada tem de comum com o que se representa no palco; não se interessa pelos personagens e a todos acha impuros e nulos; não se interessa pelas cenas e a todas acha inúteis e imorais. Só às vezes, no meio do seu tédio, se lembra que para poder ver, teve que pagar no bilheteiro!»

SABER VIVER


O cidadão eleitor Moita Flores anunciou ao mundo que não vai votar na vizinha Manuela. Consequência da inclusão do Preto nas listas manuelinas para a Assembleia da República. Não é por racismo nem por preconceito de polícia, mas por imperativo ético. Resultado:
ÉTICA 1 - POLÍTICA 0
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O candidato Moita Flores aceita o apoio do partido manuelino na sua corrida eleitoral para a Câmara de Santarém. Resultado:
POLÍTICA 1 - ÉTICA 0
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(A vizinha Manuela não retirou o apoio político ao candidato Flores. Resultado:
POLÍTICA 1 - DE VERDADE 0).

terça-feira, 18 de agosto de 2009

UMA CAMPANHA ALEGRE


«O corpo legislativo há muitos anos que não legisla. Criado pela intriga, pela pressão administrativa, pela presença de quatro soldados e um senhor alferes, e pelo eleitor a 500 réis, vem apenas a ser uma assembleia muda, sonolenta, ignorante, abanando com a cabeça que sim. Às vezes procura viver; e demonstra então, em provas incessantes, a sua incapacidade orgânica para discutir, para pensar, para criar, para dirigir, para resolver a questão mais rudimentar de administração. Não sai dela uma reforma, uma lei, um princípio eloquente, um dito fino! A deputação é uma espécie de funcionalismo para quem é incapaz de qualquer função. É o emprego dos inúteis.»

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


segunda-feira, 17 de agosto de 2009

UMA CAMPANHA ALEGRE


«Nós não quisemos ser cúmplices na indiferença universal.
E aqui começamos, sem azedume e sem cólera, a apontar dia por dia o que poderíamos chamar - o progresso da decadência. Devíamos fazê-lo com a indignação amarga de panfletários? Com a serenidade experimental de críticos? Com a jovialidade fina de humoristas?
Não é verdade, leitor de bom-senso, que neste momento histórico só há lugar para o humorismo? Esta decadência tornou-se um hábito, quase um bem-estar, para muitos uma indústria.Parlamentos, ministérios, eclesiásticos, políticos, exploradores, estão de pedra e cal na corrupção. O áspero Veillot não bastaria; Proudhon ou Vacherot seriam insuficientes. Contra este mundo é necessário ressuscitar as gargalhadas históricas do tempo de Manuel Mendes Enxúndia. E mais uma vez se põe a galhofa ao serviço da justiça!»

CITAÇÕES DA CAMARADA CAROLINA


Carolina Patrocínio, a mandatária socretina para a juventude, passeia, pelo PS, o seu esplendor. E, à falta de citações do filósofo espanhol Ortega y Gasset, expõe, em frases que já lhe garantem a imortalidade, o seu pensamento político:
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«SÓ COMO CEREJAS QUANDO A MINHA EMPREGADA TIRA OS CAROÇOS POR MIM. E UVAS SEM GRAÍNHAS. É UMA TRABALHEIRA».
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«SOU MUITO COMPETITIVA. DETESTO PERDER! PREFIRO FAZER BATOTA, A TER QUE PERDER!».
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E, aqui chegados, percebe-se a escolha.

domingo, 16 de agosto de 2009

UM IMENSO ADEUS


«Seria até cômico, eu aqui, todo cagado nas fraldas, dizer a vocês que tive berço. Ninguém vai querer saber se porventura meu trisavô desembarcou no Brasil com a corte portuguesa. De nada adianta me gabar de ele ter sido confidente de dona Maria Louca, se aqui ninguém faz ideia de quem foi essa rainha. Hoje sou da escória igual a vocês, e antes que me internassem, morava com minha filha de favor numa casa de um só cômodo nos cafundós. Mal posso pagar meus cigarros, nem tenho trajes apropriados para sair de casa. Do meu último passeio, só me lembro por causa de uma desavença com um chofer de praça. Ele não queria me esperar meia horinha em frente ao cemitério São João Batista, e como se dirigisse a mim de forma rude, perdi a cabeça e alcei a voz, escute aqui, senhor, eu sou bisneto do barão dos Arcos. Aí ele me mandou tomar no cu mais o barão, desaforo que nem lhe posso censurar. Fazia muito calor no carro, ele era um mulato suarento, e eu a me dar ares de fidalgo. Agi como um esnobe, que como vocês devem saber, significa indivíduo sem nobreza.»

A FRANÇA



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França, 1995. Muitos franceses ainda choravam o trágico desaparecimento do ex-primeiro-ministro Pierre Bérégovoy. Corria a campanha eleitoral e a disputa entre Chirac e Le Pen. O jornal «Le Monde» titulava: 'Os franceses vão ter de optar entre um ladrão e um fascista'.
(Quem me manda a mim ler jornais franceses e ter memória?)

sábado, 15 de agosto de 2009

NOTÍCIAS DA PIOLHEIRA


«PORTUGAL NÃO TEM DIMENSÃO PARA SE ROUBAR TANTO»
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Pedro Ferraz da Costa
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(Expresso)

FREE AUNG SAN SUU KYI


sexta-feira, 14 de agosto de 2009

UM PASSEIO NOS RESTAURADORES


...descer a Avenida, passar no Rossio, fazer o Chiado, nos Restauradores (não) vamos ao Eden.

Vinha de sair da Loja do Cidadão dos Restauradores onde pagara  facturas atrasadas, cigarro apagado, anoraque no braço e humor variável, a lembrar-se de um poema do O’ Neil, nem na porra do guichet acertamos, quanto mais na vida. A loja do cidadão, rés-do-chão  cave  sobreloja, tudo muito bem  embrulhado numa fachada mentirosa onde no alto se podia ler    teatro   eden/teatro   cinema,  baixo relevo alusivo e amplo lettering estilizado, e nada daquilo  era verdade!  Jardim de inverno com palmeiras, a elegante escadaria que dava para a plateia e agora não dá para sítio nenhum, ali  ao abrigo de uma salomónica lei qualquer do património que caucionara a amputação e assegurara  serviços mínimos, daí aquela fachada toda ela de alto a baixo mentirosa, no lugar onde  tinha sido a plateia do cinema Eden e para onde se subia de elevador e ascensorista – era assim que se chegava aos filmes no Eden, de ascensor e chauffeur fardado – a entrada, só por si uma prodigiosa antecâmara, um pré-genérico  de primeira, porque  bastava entrar no Eden e o cinema, o CINEMA,  estava logo a acontecer: no Eden não íamos ao cinema, entrávamos no cinema!... uma vez caminhara na pista nocturna de Casablanca no soalho da coxia central, a trautear as time goes by e a pensar no avião para Lisboa, Lisboa e Casablanca cidades geminadas, o início de uma bela amizade, por força de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, Rick e Ilsa despedindo-se junto a um avião com os motores ligados, Lisbonne Tanger Casablanca e um pequeno cavalo marinho desenhado na fuselagem... e com tudo isso e muito mais na cabeça, subira  no elevador da Glória, a fazer tempo. Almoços para o Bairro Alto, o contigente geral em progressão lenta, gente sortida, olhares, errâncias, taramelices, vagares; de salientar, homem à margem olhando abismado,  carapuço e alamares, peúga colorida e emblema do Oriental, mulher pregador flor-de-lis, sem lábios que se vissem (literalmente!), de headphones e saco de ráfia a tiracolo cheio de policiais da colecção Vampiro (a ir para a Barateira?), um homem sentado com um miolo de esquentador no colo, de olhos fechados e cabeça caída para trás, um homem encostado às cordas?, turistas outono-inverno um pouco deslocados, diria que ”assimétricos”, como  restos de colecção numa vitrine mal arrumada; lembrou-se do Armindo (“ai a vida que tu levas/ai pobre da rapariga que se deixou enganar”), o Armindo  a turistar enquanto descia para casa na rua das Taipas e ele a subir sem se dar conta, agora de anoraque vestido e de mãos no volante de descer do ascensor que subia, colado ao vidro da cabine, o movimento lento do elevador da Glória como se num  filme de grande produção, Lisboa acima: a cabine de banda desenhada  recuando para S.Pedro de Alcântara (ali era o Príncipe Negro, um night-club com uma pequena orquestra que tocava boleros), um sumptuoso travelling ascendente, uma elegante plongée a demorar-sea desfazer-se  lentamente sobre a fachada do cinema Condes e os  Restauradores,  a lembrar, sem ter nada a ver, aquele plano aberto sobre a cidade deserta pelo medo em O Comboio Apitou Três Vezes –  “the story of a man who was too proud to run” (dos cartazes).

 

Já faz tempo a fachada do cinema Condes não exibe o telão pintado que vestia a fachada dos grandes cinemas, já faz tempo Katharine Hepburn e Humphrey Bogart na Rainha Africana, os últimos de que se lembrava, arrumados ao desbarato  no bolor de um qualquer cemitério de telões, desaparecidos definitivamente da fachada do cinema Condes por cima da varanda sobre a avenida, aí onde os guarda-freios puxavam os eléctricos até ao ponto nove  dando em ir inventando  o andar a nove que, tanto quanto sabia, começara  lá mais para trás, logo depois do alegre espalhafato dos americanos da carris ao longo das ruas de Lisboa; flash-back, postal ilustrado em dimensão cinéfilo, diria! gostar de pensar Lisboa como a cidade dos eléctricos, o deslizar na máquina do tempo, os itinerários, as depredações e as escaras do tempo nas ruas da cidade; então, faz de conta que tilintantes eléctricos descendo a avenida, andores trepidantes com gente sentada de perfil e equilibristas tristes de mala a tiracolo dançaricando e picando bilhetinhos coloridos, pequenos salões iluminados na noite, relutantes guarda-freios fardados de castanho, assentos de palha entrançada, portas guarda-vento, lâmpadas Lumiar, sabonetes Ach Brito, o misterioso homem de preto  Porto Sandeman, no eléctrico que desce e  no letreiro luminoso por cima do Hotel Internacional na pequena Piccadilly do Rossio, passageiros debruçados na guilhotina das janelas espreitando de relance a sala de espelhos do café Palladium onde se podia ver sem estar olhando; close-up, mulheres pintadas aguardando, rouge, olhos fundos, pálpebras azuis, remechendo o açúcar nas chávenas de chá, voltando-se devagar numa sedução cansada, num meio sorriso entristecido; logo endireitando-se, dando-se ares, reinventando-se, fazendo tempo, morrendo por fazer tempo... morrendo por morrer, as aparatosas  mulheres pintadas de rouge e azul às mesas do café Palladium!... o eco abafado das bolas nas mesas de bilhar na sala avarandada do primeiro andar, um cheiro doce a café aquecido; subir o corrimão de latão trabalhado, varandim interior com homens encostados;  então, branca e vermelha  coladas no canto, bola difícil e Xavier balançando entre massé e tacada corrida, balançando e que Xavier! petrónio nas indumentárias e Xavier de sua graça, um caso!... descendo do lº bairro fiscal a Sapadores para os bilhares elegantes da Baixa, dândi fora de prazo, “pipi da tabela” entrado na idade, boquilha e laço de seda, sapato polido,mãos tratadas, unha de verniz, pontificando às três tabelas em tudo o que fosse cave ou sobrado de bilhares entre Palladium e Chave d’Ouro, engolindo abatanados que sobem com os cofrezinhos do açúcar pela escada de latão trabalhado, enquanto olha as mulheres pintadas, sentadas nos espelhos – labioso, dissimulado,  teria mais que contar do que a nau catrineta mas fica calado, diz que não pode, o emprego no Estado, o abuso de confiança, graceja que jurou a constituição de 33, assim... pela mobilidade, fiscal dos isqueiros (no mínimo!), suspeita-se, tabelando a compôr o orçamento... mas deixemos Xavier debruçado no feltro verde da mesa entregue ao dilema de como tacar as bolas coladas, e sigamos o menos manifesto senhor X, outro balanço, agora a fazer o favor de ir ao telefone, a sair apressado, a compor o chapéu entre o indicador e o polegar a lembrar um galã de filme italiano, Amadeo Nazzari podia ser; saias plissadas  pregadores alfinetes de gravata  boquilhas  telefones brancos; voo raso no passeio a tentar passar despercebido, abetarda de casaco aberto na pressa e no vento, fazendo-se de novas se interceptado por quem tentara evitar, de quem tentara escapulir descendo na sombra do passeio; expedito a saltar o degrau para o chafariz do Pirata, salta a pulga da balança que vai ter à França; passar figurinos, tecer  de enredos  e negócios de mesa de café; entrando de viés  pelo écran das sessões contínuas do cinema Restauradores, logradouro comum, terrenos apertados como os da tauromaquia (logo onde se foi meter!), a janela incandescente da cabine de projecção, a luz branca do comboio das sombras em sentido contrário; abetarda acuada a meia sala fazendo tempo e agacho (mestre Isidro, caçador e carpinteiro) saltando para o meio do filme a meio da tarde e de filme para filme como entre duas paragens; a mão (enluvada?)  que afasta a pesada cortina de veludo azul mesmo ao lado do Pamplinas Maquinista que agora faz prova de coragem, atenção redobrada (eu se fosse a ti não tinha querido saber, não me tinha  metido nisso fosse isso o que quer que fosse ou viesse a ser, eu bem te dizia!), faz meia volta e desaparece dissolvido na luz que cega (capotazo perfeito, magia ensaiada: driblar e sair jogando, só faltou aplaudir!),ao fundo Pamplinas segue imperturbável, tem uma missão a cumprir e o braço passado sobre os ombros do medo...( os meninos a correr e as meninas a aprender mais o  Amadeo Nazzari que se irá esconder...), voltar à rua e à fila sonora dos eléctricos na paragem do cinema Éden, cinema Éden que era também, afinal, um magnífico navio deco ancorado junto ao Palácio Foz; janelas redondas como  vigias, presumir as cadeiras de descanso e a noite lá fora, um deck e um  mar, talvez o cruzeiro do sul; recantos com cinzeiros de pé alto cromados, pequenas enseadas com maples de cabedal onde se podia fumar descansado, bar de tectos baixos  e balcão afável com a máquina de café dos quadros do Hopper, num chamado nighthawks; insólita a rajada das cadeiras da  plateia ao terminar da sessão, tata ta tata tatatata ta, como se um destroçar em ordem unida, lá onde é agora cave rés-do-chão sobreloja, conferia de novo, António Silva na fachada, Beatriz Costa, empregadinhos do Grandela  a caminho da parte de casa alugada no Bairro das Colónias,  chapéus há muitos  quase uma palavra de ordem, minha lã meu amor  uma eternidade depois; vendedores de gravatas,  línguas de seda  coloridas e pregão cantado, cauteleiros com boné de pala rígida e décimos de lotaria pregados no peito com alfinetes-de-ama, como velhos militares errantes de uma guerra esquecida, figurantes condecorados de uma guerra que ficara por fazer; e logo uma trégua, um compasso, um sossego bom, uma espécie de bem-aventurança devida, de doçura guardada e contudo, mas porém todavia, as adversativas todas, legionários com emblema na lapela, soturnos,  escanhoados a Pitralon, aparados a restaurador Olex, entrando e saíndo do café Aviz, segredando, inquirindo, passando palavra; a língua pequena da delacção a chegar com o dedo apontado, o lodo viscoso da  suspeição a alastrar, a enredar-nos, a tolher-nos os passos e um medo encolhido ao fundo dos olhos, uma culpa tia velha, uma velha culpa residente, tão familiar, tão natural que já quase não passamos sem ela... cinema Condes que agora deixou de o ser e o Odeon onde uma vez  passara um fim de tarde com Sarita Montiel, amado mio te quiero tanto/no sabes cuanto /ni lo sabras , o Éden que agora é aquela fachada mentirosa, a fazer de conta, o hotel por cima e a loja do cidadão por baixo, mais aquelas  palmeiras desoladas como espanadores de plástico  numa montra de drogaria, no passeio dos Restauradores quando se desce e depois  é o hotel  Avenida Palace que já teve melhores dias e até espiões ingleses...

Meimendro, acabara de subir uma rapariga com o cabelo solto e o vento e um vestido amarelo e a palavra entrou esvoaçando atrás da rapariga, meimendro, assim como faz a mosca  da visita (do que se havia de lembrar!), na pausa para os preceitos e as cortesias, os desvelos  na porta na frente que se abre para acolher a visita, as mais das vezes precede-a mesmo e voa  zumbindo e pousando pela casa toda antes de ir ao engano do açúcar ardilosamente espalhado na folha de papel  pardo e do voo cego para o fosso de vinagre do elegante apanha- moscas de vidro, mas enquanto voa e zumbe e poisa e voa e zumbe e poisa entre a pedra da mesa da cozinha e os pessegos maduros da natureza morta na parede, a garrafa de cristal com o licor de laranja e os pingentes empoeirados do lustre da sala, uma mosca a dar a volta à casa, dizemos vamos ter visitas e é afiançado, pela tarde há sempre alguém a bater às mãozinhas de ferro da porta da rua... meimendro, flor campestre, deitou-se logo a adivinhar, espreitando para dentro da infância por alturas do Largo da Oliveira, porque lá muito muito para trás, para aí numa manhã fresca de quintal com um poço uma nora e um tanque de rega, uma galinha a depenar num colo com um avental, laranjeiras em flor e um braçado de ervas junto ao peito de alguém que caminhava, mesmo lá muito muito para trás, alguma coisa se moveu. E foi logo apontar no caderninho de capa preta que tinha para respigar o que o cesto roto dos acasos do mundo ia deixando cair na maré vasa dos dias. E assim foi subindo para S.Pedro de Alcântara com a palavra mosca da visita apontada e atribuída, como se verá, meimendro, dois emes maternais, talvez a mais consoante de quantas o alfabeto, de mãe mar amor morte, mãemaramormorte, toda ela regaço, paixão, gravidade e leveza, rua do Grémio Lusitano acima, enquanto alargava o passo  na chuva miudinha, e quando chegar a vez de  abrir o dicionário  lerá, quase sem surpresa, “planta solanácea, medicinal (do latim milimindrum)”, o que dela relata o Candido Figueiredo, e vai pensar que  não há-de ser bem isso um meimendro, que há-de ter um jeito de se levantar da terra, uma flor que desponte, um cheiro, um ciclo, um tempo, e que se fosse mais precavido não se fiaria lá muito nisso de dicionários dizendo coisas tão irrelevantes sobre palavras tão remotas e substantivas, se fosse mais precavido e menos consoante, mais conforme ao seu natural e não se tivesse afastado tanto nem para tão longe, tão para fora de pé, não  precisaria de frequentar tanto os dicionários que são assim uma espécie de memorial ou de mostruários de retrosaria das palavras, para trazer de volta o que vai esquecendo. Mas por enquanto e à revelia dos dicionários, meimendro está destinada a ser uma rapariga com luz própria como aprendemos nas ciências geográfico-naturais acerca das estrelas, um longo cabelo a soltar-se na dança do vento e um vestido amarelo, um alarido  um fogo-preso, uma rapariga cassiopeia com um tal jeito de olhar que ele ali ficaria a descontar à eternidade que lhe couber, o tempo que fosse preciso...

 

E aqui chegado é como se, na ferrovia vária do seu viajar, tivesse mudado de bitola, não lhe estando nada a agradar o tom inesperadamente confessional que, suspeita com razões para suspeitar,  aquilo pode vir a tomar ou já tomou, a não saber muito bem como fora ali  parar nem como dali iria sair, aquela inesperada  dificuldade em meter a rapariga meimendro (cassiopeia) no avião para Casablanca e deixar-se  ficar em Lisboa, as time goes by,  Casablanca e Lisboa cidades definitivamente geminadas como já sabemos mas nunca é de mais lembrar  ( ele a dar-lhe e a crónica a fugir...), ele que só fora à loja do cidadão pagar  um gás atrasado e, enquanto esperava vez, se pôs  a olhar com detalhe aquele pé direito cheio de quadros luminosos e de cidadãos para baixo e para cima, insolventes ou desmazelados ou acumulando, não destrinçava, não distinguia bem, e a lembrar-se  do poema do O’Neil  porque não tinha a certeza de ter tirado a senha para o guichet certo e se não acertava nem na porra do guichet, a pensar em tudo e em nada e no que vinha à rede (a crónica a adornar), foi quando  se sentiu assim  como que a levitar, primeiro de mansinho e depois, subitamente, a vertigem a pegar-lhe pela gola do anoraque, ainda atribuiu a algum sobressalto da tensão ou às duas ginginhas no largo de S. Domingos ou à tagarelice desembraiada no  chafariz  do Pirata, derivado a (ti Manel da Lança, criado de lavoura) derivado a ter-se cruzado com um antigo companheiro das áfricas, mas depois viu que estava era a subir de elevador e ascensorista para as luzes da ribalta da pista de Casablanca  a meio da plateia do Eden, para  a tarde com a Sarita Montiel, a apanhar o eléctrico para o bairro das colónias e então deixou-se ir... o melhor agora  era mesmo parar quando ainda tinha pé, pensava ele que tinha, encher o peito de ar e dar umas braçadas dali para fora, e meter na cabeça por uma vez que falar de si era sempre mudar de assunto e o que tinha mesmo era de voltar depressa para o salva-vidas  do elevador da Glória que navegava  Lisboa acima, pôr-se a bom recato  (o sotaque indefinível do professor Florival, um velho bramane  goês sempre perfumado, a ensinar francês no meio do alentejo...) era mais seguro, para o meio  dos turistas assimétricos, para a mulher dos policiais, a mulher  dos headphones que subia com  os vampiros para a Barateira e que, não saberia explicar bem porquê, só devia dar mesmo ares a ela própria, a ajudar com o miolo do esquentador o homem encostado às cordas, para a rapariga cassiopeia (fogo-preso) que agora, sem nenhum pudor, diria  mesmo que despida de todo o pudor (ou vestida desta meia contradição nos termos?) titilava o telemóvel (titilava, digo bem!), lenta e despudoradamente e como que perdera a piada que tinha para ganhar uma outra que ainda não tinha nem seria  bem piada, antes um outro andamento, um andante con fuoco silencioso, fremente, diria que uma batida  assim como que mais nocturna e mais feita de noites longas vagabundas e de palavras adormecidas sopradas no ouvido, urgente entrar para o salva-vidas do elevador da Glória, pôr-se a bom recato (o professor Florival, um mistério eternamente a dar-se a cheirar, o cabelo luzente e os dedos enfiados nos anéis de marfim, fumando cigarrilhas francesas...) e  sair para fora daquela crónica que tinha tomado o freio nos dentes, que  claramente se tinha descontrolado, que a olhos vistos se desconjuntava, e lembrar-se que o vento não ajuda a quem não sabe para onde vai... eu não te dizia que  para  me atrever assim, como dizer, a cronicar, como alvitraste, mesmo sem pretensão, deveria antes ter praticado um bocadinho todos os dias para assegurar um nível, digamos assim, medíocre, que é como o Woody Allen  classifica a sua performance  de clarinetista (at Elain’s)... mal comparado, evidentemente!... e já agora, aqui para nós, mesmo sem gostar eu até ia escrever prestação em vez de performance mas não escrevi porque me lembrei do JM, vê lá tu, e da maneira tão particular e desfrutada como ele dizia prestação e transformava aquilo tudo numa piada, como  polia tão bem polida uma palavra assim tão sem brilho, prestação, a ponto de ficar uma luzida piada para aplauso!... nós sentados lá no Alentejo, o papel cavalinho com os desenhos do Pavia no meio dos livros  do Hemingway, no meio do pátio, no meio dos gatos, no meio dos discos do Paul Anka, no meio dos cálices de amêndoa amarga;  eu não iria conseguir, uma ironia muito peculiar a dele, quase intraduzível, para o que não chegaria o itálico todo, nem o bold nem o underline que o computador põe à minha disposição para dar à manivela da ironia assistida... aquilo era exclusivamente dele, do JM que, quando ouvia falar em prestação pensava logo era na prestação da casa!... sempre que oiço trocar desempenho por  prestação lembro-me do JM, vê lá tu, lembro-me sempre dele e daquela mania de fechar o casaco no último botão, dessas coisas pequenas, muito mais do que daquela vez  na Paulistana (estavas lá?), enfática e teatral, no limite da caricatura (o que não ia lá muito com a timidez e a reserva a que se obrigava...), a desproporcionada citação do Churchill “não há déspotas benevolentes!... e tudo a olhar!... nós sentados lá no Alentejo, ainda mal refeitos da tragédia de Munique que apagara meia equipa do Manchester, o grande Ducan Edwards, a elegância acabada com o número seis nas costas (daí para cá fomos sempre do Manchester, continuo a ser), o Relicário e o Tango à Media Luz no gira-discos no terraço da vizinha, a folhear o Diário Ilustrado, às voltas com os gatos e o assalto ao quartel de Beja e a ler o Charyl Chessman que aguardava no corredor da morte, o Salgari e o Erico Veríssimo, o Galvão  a “abrir o baile” no Santa Maria e o Palma Inácio, o nosso major Alvega (avant la lettre), algures pelos céus a mandar papelinhos insurrectos, e o Vd, nosso amigo “vespertino” e ardina improvável, “exaurido pelo peso da imprensa da tarde” (eu e o JM, brincando com ele) a acarretar jornais pela vila toda e a revolução a assomar no cerro do Cercal, o Vd a querer tudo armado e nós no Fitzgerald, o Vd a sonhar com o Cunhal desembarcando de traineira nos areais de Porto Covo e nós Terna é a Noite, o Vd a preparar-se e nós na Patrícia Joyce...vocês só lêem só lêem, porra, só lêem!... mesmo muito mais do que  da manhã na doca de Alcântara a  ajudá-lo a enfiar-se na banheira do  Ana Mafalda a zarpar para a Guiné, para Madina do Boé, de onde sabemos que já não voltou, muito mais do que isso, de coisas pequenas como abotoar o casaco  no último botão, dessas e de outras assim, de coisas sem importância nenhuma vê lá tu, e tenho tanta pena pá!... vai-se pela  Sarita Montiel e ainda se acaba no Joselito coração de ouro ou coisa pior... e já agora, que me lembre, o Odeon depois daquela entrada de leão com o  Stroheim  nunca mais passou nada de jeito, marmelada e art deco  ainda assim, debaixo daquele tecto  belíssimo em quilha de navio antigo e pau-brasil, no aconchego discreto das últimas filas quando o Joselito coração de ouro punha toda a gente a chorar – sabes lá,  um choro pegado, não direi convulso mas pegado, assim silencioso e cheio de lencinhos bordados, uma manada de vitelas desmamadas literalmente às mãos do coração de ouro, o pequeno roussinol...

... mas  rebobinando e voltando atrás, feitas as contas, por deixarmos passar os prazos, e isso tudo de deixar passar os prazos não é lá grande ideia e não é líquido que se  acabe sempre nos  braços da Montiel... feitas as contas, somando tudo muito bem somado e tirada a prova real e a dos nove, não andamos para aí todos, gerações atrás de gerações atrás de gerações, a pagar facturas atrasadas atrás de fachadas mentirosas, não andamos? e ora aí está uma bela meia  metáfora  à  la minuta  e um  pobre de um pensamento meio atilado e tudo – bonito serviço, agora é que me vão levar mesmo a sério e mandar Porca de Murça pelo Natal!... e acende um cigarro a pensar que este presente assim tão reverente, tão confinado, tão loja de conveniência, tão montra da Zara ao domingo à tarde, não pode ter lá grande futuro e, mesmo que o tivesse, toda a gente sabe que o futuro antigamente era muito melhor, como já dizia o Karl Valentim três quartos de século atrás... mas andamos para aí todos a pagar facturas atrasadas, não andamos?...

 E agora está a olhar para o Rossio lá em baixo, com o teatro nacional DMII com as colunas da fachada do Hospital de Todos os Santos, lá está!,isto das fachadas mentirosas é fatal, um desígnio nacional que devia ser acarinhado, que devia ser  dado nas escolas a partir da pré-primária... no  centro a  estátua do  senhor D.Pedro IV, criatura de resto estimável (vá conta lá a anedota pá, estás mortinho por contar a anedota...), a fazer-se passar por um qualquer imperador Maximiliano do México ( já cá faltava! não tens nada melhor para “gratinar” a crónica?) ao que consta comprada nas promoções  de uma qualquer fundição de Oeiras francesa, o que não era verdade mas depois também foi ficando sem ser mentira... de resto a coisa já fizera caminho suficiente para, com verdade , poder ser desmentida (repete lá isso!) o que aliás, à mesa competente do Snob, não passou pela cabeça de ninguém fazer: a coisa era tão engenhosa e ficara tão engraçada, tão rocambolesca, até metia fiacres na noite da Rocha do Conde de Óbidos, uma escuna francesa fundeada no Tejo e a Severa meio descomposta do quadro do Malhoa, a cantar para marinheiros franceses (o quê?)  imagino que  de pompon e tudo!... portanto não sendo bem verdade e já nem sendo bem mentira...(já vejo o elevador da Glória lá ao fundo!), non e vero ma e bene trovato (linguafone, trinta lições), o riso geral à mesa verde e entendida do Snob, ninguém a atrever-se a desmentir, também para quê, depois o senhor D.Pedro IV  tão lá no alto, tão inacessível, tão de pedestal, tão no meio dos pombos...  e assim tudo aquilo ficou uma espécie menor de coisa nenhuma, de aldrabice pegada em fado menor (ou fado carriche?) e as tubas clangor sem fim...

 ...pré-comprado? essa agora!...(ai a velha culpa tonta...) e enquanto, obsequiosamente, vira a carteira do avesso à procura do “módulo”, do “título de transporte”, para introduzir na ranhura do “obliterador” fica a pensar que com esta chuva toda e esta brandura quase tropical, talvez este ano os jacarandás venham a florir mais cedo ...

 

CASIMIRO BRANCO

(Nota do 'editor': Foram meses de insistência, mas consegui vencer a relutância do meu amigo Casimiro Branco e publicar esta belíssima crónica. Ganhámos! - eu e os outros leitores).

PM


 


UM IMENSO ADEUS


«Chico é nome de escritor ruim», disse ele, mas não falou verdade.
Chico, este Chico, o Buarque, é escritor de prosa fina, inspirada, imperdível. É escritor bom, muito bom. Tão bom como o compositor Chico, este Chico, o Buarque.
(Obrigado, Casimiro, por me teres alertado para a urgência da leitura de 'Leite Derramado'. Vou passar palavra. Já fiz o mesmo com 'Caos Calmo' do Sandro Veronesi).
E, agora, vou ouvir a 'Banda', do Chico, deste Chico, o Buarque, cantar coisas de amor e esquecerei, por minutos, as misérias da piolheira. Até já.

AI, AI, AI, AI, AI, AI...ALCOCHETE


Dois candidatos autárquicos de Alcochete (PSD e CDU) envolveram-se em violentas cenas de luta livre.
Vai sendo tempo de o Ministério do Ambiente definir uma nova Zona de Protecção Especial para que os todos os Tarzans Tabordas daquela famosa localidade possam praticar, nas melhores condições, todas as disciplinas das nobres artes marciais.
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BLOGUE PITECOS

OS BLOGUES DO PADRE AMÉRICO


Dois dos rapazolas envolvidos na operação «Restauração da Monarquia» foram constituídos arguidos, o que está a provocar um grande e abrangente movimento de indignação na blogosfera.
Seguidor dos ensinamentos do padre Américo, junto-me ao movimento e grito a plenos pulmões: «NÃO HÁ RAPAZES MAUS». Não incomodem, pois, os jovens animadores da 'silly season' (inglês técnico), esses Costas e Buíças ao contrário e em versão 'light' (outra vez o inglês técnico) e a quem a nação já tanto deve.
Maus, maus eram aqueles rapazes da Carbonária. Mas a espécie extinguiu-se por acção divina, seguramente, e até esses, graças às orações do padre Américo e dos seus seguidores (onde me incluo, como atrás ficou dito) se converteram e, hoje, refrescam as suas asinhas de anjo nas maravilhosas águas da praia dos Tomates.
Haja tolerância e continuemos as orações. Ámen.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

SONDAGEM


O 'Menino de Ouro do PS' assinou um panfleto que o director do 'Jornal de Notícias' alcunhou de artigalhada e fez publicar nas páginas do jornal.
Li a coisa e mostrei-a, depois, a um cigano que vende tachos e panelas de alumínio (os melhores e mais baratos do mundo), aqui na feira de S. Pedro.
O homem, que não cursou português técnico em nenhuma universidade independente, leu vagarosamente, com o auxílio do dedo indicador direito, e rematou com um comentário 'SIMPLEX': «Nem o Camacho Costa ,dos 'Malucos do Riso', escrevia tão bem. Esta criatura vai ter uma brilhante carreira.»