domingo, 16 de agosto de 2009

UM IMENSO ADEUS


«Seria até cômico, eu aqui, todo cagado nas fraldas, dizer a vocês que tive berço. Ninguém vai querer saber se porventura meu trisavô desembarcou no Brasil com a corte portuguesa. De nada adianta me gabar de ele ter sido confidente de dona Maria Louca, se aqui ninguém faz ideia de quem foi essa rainha. Hoje sou da escória igual a vocês, e antes que me internassem, morava com minha filha de favor numa casa de um só cômodo nos cafundós. Mal posso pagar meus cigarros, nem tenho trajes apropriados para sair de casa. Do meu último passeio, só me lembro por causa de uma desavença com um chofer de praça. Ele não queria me esperar meia horinha em frente ao cemitério São João Batista, e como se dirigisse a mim de forma rude, perdi a cabeça e alcei a voz, escute aqui, senhor, eu sou bisneto do barão dos Arcos. Aí ele me mandou tomar no cu mais o barão, desaforo que nem lhe posso censurar. Fazia muito calor no carro, ele era um mulato suarento, e eu a me dar ares de fidalgo. Agi como um esnobe, que como vocês devem saber, significa indivíduo sem nobreza.»