Ao Exmo. Senhor António José d'Ávila, Marquês d'Ávila, Presidente do Conselho de Ministros
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«Exmo. Sr. - Pego na pena, mais pesaroso do que irritado. As misérias morais de qualquer homem contristam-me, porque vejo nelas o abaixamento da alma humana, que devia pairar serena e sem mácula. As misérias morais dos homens, que pela sua posição, pela autoridade, pelos anos, têm missão de dar o exemplo da justiça incorruptível, e ser como apóstolos entre as nações, essas compungem-me dobradamente, porque vejo nelas a degradação duma coisa augusta, a lei, e o envilecimento duma coisa veneranda, os cabelos brancos. Nada disto, porém, exclui a indignação: somente, é uma indignação entristecida. Porque havia V. Exa., velho que eu não conheço, ministro que eu quisera respeitar, fazer calar em mim o respeito que é devido aos anos e à posição, e obrigar-me a falar-lhe num tom, que não é o da cólera, mas que é o da indignação, e que pode ser o do desprezo? Se os cabelos brancos, que passam diante de mim, em vez de terem a compustura plácida das cabeças dos santos, trazem nos seus anéis emaranhados as palhas da loucura, posso eu deixar de sorrir aos esgares do louco, e enxotá-lo do meu caminho, se mo embaraça?
Vou ser descaridoso com V. Exa., porque V. Exa. deixou de merecer a minha caridade.
Dirigindo-me a V. Exa., dirijo-me sobretudo ao público: por isso escrevo pela imprensa. Particularmente não lhe escreveria, porque me prezo de não ter por correspondentes senão pessoas inteligentes, pouco condecoradas, e de provada ortodoxia em gramática portuguesa. V. Exa. não está neste caso.»