Na casa da democracia berra-se e insulta-se. A misoginia, o racismo, a xenofobia, o capacitismo, a homofobia e os crimes de ódio têm palco entre risos e preparação de “tick tocks” com os verbos do nosso novo mundo: “arrasa”, “destrói”. De caminho, a extrema-direita afirma um novo homem virtuoso, o que humilha e não chora: “aqui ninguém chora”. O PAR podia ser um robô, não está ali para afirmar a República, para dizer coisas simples como “todas as crianças têm direito à escola”. Está ali para distinguir gramaticalmente substantivos e adjetivos. E assim temos um Parlamento que legitima o inaceitável no Regime de Abril.
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Ouvimos João Almeida dizer que acabou o tempo em que “nós” tratávamos imigrantes e nacionais da mesma forma (aquela imposição do artigo 15º da Constituição) e ouvimo-lo dizer que o país está a reconfigurar-se, já não o reconhece. Nunca tinha visto no CDS esta pontada súbita de teoria de substituição e parece-me evidente que não é no Príncipe Real que João Almeida se sente ameaçado na sua nacionalidade. O critério, de resto plasmado na obscena proposta de lei da nacionalidade, é cromático, é de sangue: querem, como nacionais, bisnetos de um português distante e não querem os que aqui estão há 5 anos por adesão. De onde vem a sensação de reconfiguração do país? Pergunto se João Almeida sentiria alguma reconfiguração se visse António Costa ou Francisca Van Unem numa rua qualquer do país e fossem ambos pessoas anónimas. Que sensação é essa? Não houve sobressalto geral. O limite do PAR é “fanfarrão”.
Isabel Moreira (Expresso)