quarta-feira, 1 de junho de 2016

DE OUTROS

 O populismo é hoje uma questão dos meios, das mediações, e não uma questão política. Não é um apelo ao povo, mas às audiências. Não é um discurso político, mas um modo de funcionamento em que não há senão mediação derivada e a ilusão de que tudo pode ser induzido. Dá-se assim este fenómeno estranho: as televisões — sobretudo elas — inventaram um “povo” que não existe em nenhum lado senão nos estúdios e só é conhecido pelos apresentadores de televisão. E, de um modo geral, a informação e toda a comunicação jornalística medem o seu público por baixo. No campo da cultura, isto é devastador, sobretudo porque se disseminou em todo o campo editorial. Veja-se como as editoras, nas suas campanhas publicitárias e no modo de se dirigirem ao “público”, usam um discurso que pressupõe um leitor estúpido e não emancipado. É com este populismo cultural dos media, com a crise de legitimidade que o jornalismo hoje vive intensamente, e não com o populismo político —  noção ao serviço de um discurso ideológico que não ousa assumir-se como tal — que todos nos devíamos preocupar. 
António Guerreiro
Público.