quinta-feira, 26 de maio de 2016

DE OUTROS

Da resistência



Os homens da minha geração sempre tiveram uma grande curiosidade intelectual e política pela Guerra Civil Espanhola, e pela invasão nazi, sobretudo a França. José Gomes Ferreira, o grande, o outro, chamava a estes sentimentos «a saudade do heroísmo impossível». Todos queríamos ter lá estado. Um tio meu, Manuel Bastos, morreu de armas na mão, na última barricada de Madrid, em defesa da República. Possuo uma dose considerável de livros que versam as matérias. Um deles, «Les Franc-Tireurs Partisans», de Charles Tillon, é um documento impressionante pela veracidade do testemunho que despreza o maniqueísmo da mística da Resistência e repõe as coisas no seu devido lugar. Nem anjos nem demónios, apenas homens e mulheres, com os defeitos e as bravuras da condição humana. Tillon opôs-se ao Pacto com veemência e destemor. Os primeiros combatentes da Resistência foram os católicos. E Tillon presta-lhes homenagem. O Pacto Germano-Soviético, causa de tantas dissidências e perplexidades, afastara os comunistas, com desespero e cólera, da luta e do enfrentamento armado. Apagar os factos não traz benefícios a ninguém. Só quando Hitler invadiu a União Soviética a sorte da História alterou-se. O partido dos fuzilados foi, então, o grande partido da Resistência. Falo destas coisas antigas porque a RTP2 tem exibido, de segunda a sexta, a partir das 21 e 30, «Uma Aldeia Francesa», série de grande qualidade artística, ética e política, que versa estes problemas das fraquezas e das integridades da Resistência: o adultério, as porcarias de comportamento, o colaboracionismo, a duplicidade e a delação, a aceitação quase sem protesto de situações sórdidas, franceses contra franceses. A série é também comovente por não ocultar as amolgadelas do ser humano e do seu carácter frequentemente dúbio. Atrevo-me a dizer que este programa é magistral a múltiplos títulos e por múltiplas razões.
Baptista-Bastos
CM