sábado, 19 de março de 2016

DE OUTROS

Podemos acreditar que Marcelo Rebelo de Sousa vai ser um óptimo Presidente, mas é de uma enorme irresponsabilidade estético-cultural (mais do que política) poupá-lo a esta evidência: o seu discurso e os prolongamentos que ele teve deram expressão ao que se pode chamar “Kitsch de massa”. Foi a ocasião para assistirmos ao Kitsch elevado a um nível olímpico. A empatia e a operação mimética que produz a emoção são os princípios fundamentais do Kitsch e no plano político sempre estiveram ligados aos rituais de aclamação e foram instrumentos de consolidação do poder constituído. Quem só conhecia as performances orais e teatrais de Marcelo Rebelo de Sousa, na televisão, este discurso escrito, mesmo analisado com a maior indulgência e tendo em conta a circunstância, revela uma elaboração escrita elementar, uma total ausência de densidade. E se não era a ocasião para satisfazer exigentes requisitos, ao menos que mostrasse as virtudes de uma prosa desenvolta, capaz de avançar sem ruído e com perícia. Durante anos, na televisão, o agora Presidente foi um exemplo para a configuração do nosso tempo: aquele em que o gosto das elites coincide com o gosto das massas. Descobrimos agora que o Kitsch é a sua última máscara — a máscara do banal. Não é altura de extrair conclusões sobre as suas qualidades políticas de Presidente. Mas percebemos que, afinal, a verdade do teor intelectual do Presidente pode muito bem ser a do “brilhante” Professor Marcelo tal como ele se exibia na televisão.
António Guerreiro
Público