Combate à corrupção em Portugal sem progressos
De 13 recomendações do Grupo de Estados Contra a Corrupção do Conselho da Europa para melhorar as incriminações de suspeitos e a transparência do financiamento partidário em Portugal, só uma foi implementada
Lisboa, 11 de fevereiro de 2013
A Direção da TIAC – Transparência e Integridade, Associação Cívica, representante portuguesa da rede global anti-corrupção Transparency International, lamentou hoje a reiterada falta de progressos na luta contra a corrupção por parte das autoridades portuguesas, sublinhada mais uma vez no último relatório de avaliação do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO). Os resultados do recém-publicado relatório de observância das recomendações dos avaliadores do GRECO no âmbito da terceira ronda de avaliação, que incide sobre os procedimentos de incriminação e a regulação e supervisão do financiamento político, são desoladores: Portugal só implementou 1 das 13 medidas recomendadas pelo GRECO; 4 foram parcialmente implementadas e 8 não foram implementadas de todo.
«Em matéria de combate à corrupção e de boa gestão de dinheiros públicos, Portugal só costuma agir sob pressão de organismos externos, como o GRECO, e mesmo assim, de forma relutante e sem uma estratégia clara. Não há vontade política e isso começa desde logo, pela total ausência de medidas concretas neste domínio nos programas de governo e acaba no total desnorte da justiça. É de lamentar que hajam cidadãos a responder em tribunal pelo crime de difamação – uma verdadeira aberração jurídica – por se terem insurgido contra a prepotência, o clientelismo e a inoperância das autoridades judiciárias, enquanto eleitos condenados por crimes de fraude e abuso de poder continuam no exercício de funções em claro desrespeito pelo Estado de direito; é de lamentar que dedicados funcionários públicos se prestem a colaborar com a justiça, denunciando a corrupção sem qualquer proteção do Estado, ficando a mercê de todo o tipo de abuso na sua vida pessoal e profissional; é ainda de lamentar que o cidadão tenha que sofrer todos os apertos fiscais possíveis, mas que o Estado não se preocupe em recuperar os ativos ilícitos», diz o presidente da TIAC, Luís de Sousa.
Na área da incriminação de suspeitos de corrupção, o GRECO tinha feito seis recomendações concretas. Destas, apenas uma, relativa à formação de magistrados e outros operadores judiciais, foi considerada satisfatoriamente implementada. Todas as outras, cobrindo questões como o alargamento da aplicação dos crimes de corrupção a um maior número de agentes públicos, o agravamento das sanções por suborno e tráfico de influências e a criminalização do tráfico de influências em transações internacionais, não foram de todo aplicadas. Para a associação, a falta de progressos a este nível destrói os avanços que se têm registado noutros domínios – de que é exemplo o aumento de 13,5% no número de inquéritos abertos por crimes de corrupção na Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, recentemente noticiado. «A exigência de justiça por parte dos cidadãos tem sensibilizado o Ministério Público e trazido maior atenção sobre esta criminalidade, mas os inquéritos serão inconsequentes se Portugal não se apetrechar convenientemente para investigar, acusar e condenar os culpados de corrupção. Recordemos que a média de arquivamento dos crimes de corrupção supera os 50%, isto, é 1 em cada 2 processos é arquivado à nascença», diz Luís de Sousa.
No que toca ao financiamento político, Portugal só cumpriu parcialmente 4 recomendações em 7. Três ficaram por cumprir, nomeadamente: 1) uma relação mais frequente e mais transparente das receitas e despesas de campanha durante períodos eleitorais; 2) a elaboração de um estudo sobre as práticas informais de financiamento político, em particular no que concerne o pagamento de despesas por terceiros; e 3) o reforço do papel de supervisão da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, dotando-a de uma intervenção mais proativa em relação aos partidos políticos. Todas estas medidas correspondem às preocupações e recomendações apresentadas pela TIAC no âmbito do Sistema Nacional de Integridade. É de lamentar que as autoridades portuguesas tenham feito pouco uso do seu conteúdo.
«Esta falta de progressos é absolutamente dececionante. O Governo desculpou-se alegando que a presença da troika em Portugal atrasou a alteração de algumas leis recomendadas pelo GRECO, porque o Governo e o Parlamento estiveram ocupados com a implementação do plano de resgate. São desculpas de mau pagador – sobretudo quando é óbvio para todos que, sem um reforço dos mecanismos de prevenção e combate à corrupção, o país continuará no mesmo ciclo de má gestão de dinheiros públicos e nunca sairemos da crise», diz Luís de Sousa.
A TIAC lamenta ainda que o Governo não cumpra a recomendação do GRECO que pede a tradução e disponibilização pública dos relatórios de avaliação. «Disponibilizar estes relatórios online, em português, é fundamental para esclarecer os cidadãos e permitir um debate informado sobre os problemas do combate à corrupção em Portugal. Que nem esta obrigação elementar seja cumprida é um sinal do desconforto com que o Estado português tenta evitar o debate e a responsabilização por tudo o que continua por fazer nesta área», avalia o presidente da TIAC.
A Transparência e Integridade compromete-se a fazer o trabalho a que o Governo se esquiva, mobilizando os seus voluntários para traduzir para português o último relatório de avaliação do GRECO. O documento será publicado no portal da associação, nas versões em inglês e português.
TIAC