terça-feira, 24 de maio de 2011

UM IMENSO ADEUS

«Mas antes de se dirigir ao apartamento do major Calapez, o Varela Gomes, dando por adquirida a sua detenção, acendeu três, como fora combinado, uma lanterna verde numa das janelas do primeiro andar do edifício.
Depois disso, encaminharam-se ambos para o quarto do comandante.
Quem bateu à porta foi o capitão Varela Gomes. O major Calapez, que estava de prevenção, perguntou quem era. O Varela Gomes, que se informara do nome do sargento da guarda, respondeu: «O sargento Rocha!»
O Calapez, que tinha ligações à Legião Portuguesa, estava informado de que algo se estaria a preparar e dormia sempre vestido e armado. Conhecia a voz do sargento. Percebeu que não era ele. Provavelmente conheceria a voz do próprio Varela Gomes. Entreabriu a porta empunhando uma pistola em cada mão. E disparou, à queima-roupa, sobre o Varela! Atingiu-o com dois tiros no baixo-ventre!
O Carvalho da Silva, que seguia um pouco atrás do seu camarada, vendo-o ferido, avançou para o Calapez, de pistola em punho, e gritou, apontando-lhe a arma: «Seu filho da puta!»
O comandante, aterrorizado e desorientado, pensando que o outro o iria matar, deixou cair as armas e ajoelhou-se perante o Carvalho sa Silva. Implorou-lhe que não o matasse!
Compreende-se que a principal preocupação do tenente miliciano tenha sido socorrer o camarada que acabara de ser baleado. Mas parece-me que essa louvável atitude não teria sido incompatível com a decisão de controlar um homem que se revelara tão perigoso!
Carvalho da Silva lamentar-se-ia, mais tarde, de não o ter morto. Se o tivesse liquidado logo que viu o Varela ferido, a sua atitude seria um acto natural. Teria sido num combate em que a iniciativa cobardemente atacante tinha partido do comandante do quartel.
Mas a partir do momento em que o Calapez levantou os braços e se entregou, a ética militar não autorizava o Carvalho da Silva a matá-lo. O que não podia deixar de fazer era, dali em diante, controlar os movimentos de um homem que se mostrara tão perigoso. Tinha o dever de não o deixar à solta. Devia obrigá-lo a caminhar à sua frente, desarmado e de braços no ar - e entregá-lo à guarda dos seus camaradas.
Se tivasse tomado essa precaução teria evitado que o comandante do regimento, pouco tempo depois, atingisse mortalmente dois civis e ferido outro com gravidade!»