domingo, 20 de fevereiro de 2011

DE OUTROS

«Neste tempo megalómano e exibicionista, em que todos procuram uma insaciada autoestima e já não parece haver lugar para a subtileza, a compaixão e a cortesia, convém mantermos o sentido da memória e da medida. Sempre soube que, em mim, para cada abundância há uma escassez. Aprendi cedo a admirar o que é grande e os que são grandes (mesmo que tenham vivido no século V antes de Cristo) para não reconhecer logo o que é pequeno. E o que vejo por aí é uma pequenez alucinada e convencida da sua grandeza inexistente. Por isso, não há melhores palavras para dizer este tempo e este modo do que as que Lampedusa deu ao príncipe de Salina: "Nós fomos os Leopardos, os Leões; os que vêm são os chacais, as hienas." É com o sangue dos outros que eles alimentam a vaidade que lhes impede de ver a vulgaridade e o vazio que os faz ser o que são.»

José Manuel dos Santos
(Extracto da crónica Despedida)
Expresso