sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

DE OUTROS




«Nenhum político português deixou atrás de si um rasto tão longo e tão desagradável de casos "mal explicados". Como a memória é curta, recordemos os mais relevantes:

- A forma como assinou dezenas de projectos de arquitectura e engenharia no concelho da Guarda no tempo em que era técnico da Câmara da Covilhã;

- A sua associação, por um ano, à Sovenco, uma empresa de importação de pneus em que um dos sócios era Armando Vara;

- As nunca investigadas conversas interceptadas durante a investigação a Luís Monterroso em que intercede por empresas amigas junto de autarcas;

- As condições de relativa facilidade de que beneficiou para concluir a licenciatura na Independente;

- A controvérsia da atribuição de um generoso subsídio à Deco, acima do previsto legalmente;

- O envolvimento de figuras que lhe são muito próximas no chamado "processo da Cova da Beira", que levou anos a ser investigado;

- A diferença entre o preço que pagou pelo seu apartamento na Rua Castilho, em Lisboa, e o preço pago por alguns moradores;

- O papel que desempenhou como pivot da negociação com Daniel Campelo e que permitiu a aprovação do "orçamento do queijo limiano";

- As dúvidas sobre a forma e a celeridade do licenciamento final do Freeport, a maior parte delas levantada na imprensa ainda antes da denúncia anónima e, sobretudo, da carta vinda do Reino Unido;

- O aparecimento, no Parlamento, por alturas do "caso da Independente", de duas fichas diferentes de deputado, uma delas rasurada, indiciando uma possível falsificação que nunca ninguém investigou;

Não é pois preciso lembrar a sua relação doentia com os jornalistas ou a sua obsessão com a imagem, e ainda menos de apurar o que se passou no processo de compra da TVI, para perceber que um tal "rasto" de dúvidas e casos seria notícia em qualquer parte do mundo. Ao contrário do que José Sócrates tem repetido, não houve tentativas de "assassinato de carácter": houve e haverá dezenas de notícias que existem porque alguma coisa no carácter do político não permite que olhemos para elas como casos isolados, antes formando um padrão coerente. Para mal de todos.»
José Manuel Fernandes
(Público)