terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

DENÚNCIA


Exmo. Sr.
Comandante da PSP de
BRAGA
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Soube pelos jornais que as forças que V. Exa. tão brilhantemente comanda apreenderam, numa feira de livros de saldo, exemplares de um livro sobre pintura, pornograficamente capeados com a reprodução do quadro de Gustave Courbet, significativamente denominado 'A Origem do Mundo' (olhar, DISFARÇADAMENTE, para a imagem do lado).
Não pertenço,graças a Deus, a essas esquerdas, plebeias ou chiques, em quem só apetece malhar e que, certamente, já se preparam para morder as canelas de V. Exa. Antes pelo contrário, defendo intransigentemente todos aqueles que, como V. Exa. e os zelosos agentes que enquadra, se batem sem desfalecimento contra a dissolução dos costumes. E até me disponho a ajudá-los deixando aqui esta
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DENÚNCIA:
Circula por aí, em feiras de livros de saldo, alfarrabistas e livrarias manhosas, uma brochura (não confundir com um expositor de broches) da autoria de um tal Luiz José Machado Gomes Guerreiro Pacheco, de seu nome completo, que também assinava Luiz Pacheco, assumido 'bi', libertino e abjeccionista, com o sugestivo título «O LIBERTINO PASSEIA POR BRAGA, A IDOLÁTRICA, O SEU ESPLENDOR».
Deixo-lhe aqui, sr. comandante, dois extractos do livrinho para que V. Exa. possa apreciar devidamente o esplendor do libertino:
«A trupe das estúpidas, porém, escolhe um banco lá prò fim e depois ficam todas sentadas e de costas umas para as outras e caladas. Domingos divertidos passam estas raparigas em Braga! quase quanto como o V. S. a preparar as suas petições para o ministro limpar o rabo a elas. Crio fastio de posar ao grão-senhor, distraído e benevolente com a paisagem. E começo a deambular, de árvore para árvore, e vou comprar castanhas ao cimo duma escadaria porque as duas miúdas broncas para coisas de entre-pernas vieram também ali abastecer-se; o meu fito era chegar à fala com elas e daí às mais graúdinhas. Começo a comer castanhas e fico raivoso - ou embuchado? Escrevo então dois bilhetinhos (de que desculparão o estilo parvóide: nestas coisas de engates de miúdas e, até, de graúdas, segundo opinam os entendidos, quanto mais estúpidas as declarações de amor mais resultado dão, aqui a intenção, a sugestão é tudo), em folhas arrancadas da agenda, assim: 'Preciso muito de falar consigo, diga-me o seu nome e morada'; outro assim: 'Lambia-te toda, desde as maminhas até ao pipi. Verás que gozo, é melhor que bom', em linguagem infantilizada, a ver se pega.
Mas há mais, sr. comandante, e pior. Ora leia:
«- Estão a meter-se comigo - diz o meu companheiro cheio de calma. Voltamos a ficar sós na estrada. Parece-me que já consigo agora distinguir as tais duas luzes do quartel. Devo-lhe uma explicação.
- Gostas de broche?* - pergunto e encaro-o fito nos olhos, muito sério, muito natural.
- An, nem por isso - responde sempre calmo.
- Pois é só o que eu te posso fazer - digo, como se me desculpasse de não ser o Calouste Gulbenkian».
Pois, sr. comandante, já percebeu, pela amostra, o conteúdo do livrinho. e também já percebeu que se torna urgente a apreensão dos exemplares que por aí andam em alfarrabistas, feiras de livros, bibliotecas e outros sítios mal frequentados. É buscar, é buscar! É farejar, é farejar! E não se inibam se ouvirem dizer que esse tal Pacheco era um grande escritor. Isso é conversa de esquerdas. É malhar! é malhar!
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A BEM DA NAÇÃO
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PM
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* Não confundir com brochura