Defender um regime onde se podem matar cidadãos a bel-prazer por causa da cor da pele, do estatuto social, do sítio onde estão ou moram ou das ideias políticas que têm – recorde-se que o assessor do Chega escreveu “menos um bandido, menos um eleitor do BE” – é ser inimigo do Estado de Direito, da democracia, da segurança e da paz. Que haja quem perante isso se cale, finja que não viu – como o governo – ou quem, como o presidente da República, reduza o assunto a “uns acham uma coisa, outros acham outra”, como se o viva la muerte, o elogio do homicídio e da execução extrajudicial coubessem na discussão democrática, ilustra na perfeição aquela máxima sobre o que é necessário para que o mal triunfe.
Mas há quem vá mais longe ainda – há quem faça pior que calar-se. Falo dos jornalistas. Falo da minha profissão: exaltados sempre como indispensáveis guardiões da democracia, somos nós que estamos nas primeiras linhas desta batalha. Somos nós que empunhamos os microfones e as câmaras, somos nós que estamos na régies das TV a dirigir a emissão, somos nós que decidimos o que vai para o ar, o que é difundido, o que deve ou não chegar aos nossos cidadãos. Cabe-nos mediar – não servir de pé de microfone a proclamações criminosas e a apitos de cão. Não chegar fogo a quem tem na mão um cocktail molotov.
Fernanda Câncio (DN)
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