domingo, 3 de novembro de 2019

QUEDA LIVRE

"Joacine tem sido atacada de forma abjeta. Por ser negra e assumir que isso é relevante. E a sua gaguez foi usada como motivo de escárnio. Mas é ela que escolhe a sua própria narrativa política. Ao decidir escrever um texto sobre a sua gaguez e ao desdobrar-se em declarações sobre si mesma, escolheu desviar as atenções da política. Assim como tendo o seu assessor todo o direito de se vestir como entende, quando resolveu partilhar com a imprensa que até esteve para usar outra saia mais colorida, mostrou que aquele foi um gesto comunicacional, não podendo depois refugiar-se na liberdade indivi­dual para retirar aos outros o direito de o comentarem como tal. São opções com recompensa mediática mas custos políticos. A conversão súbita do Livre à agenda identitária — onde está o partido de Rui Tavares? — apanhou-o impreparado. Os seus protagonistas correm desembestados e sem direção política por um campo de minas. Até cada exibição gratuita de experiências pessoais se transformar em bandeiras vazias de reivindicações políticas. Até o tempo que a gaguez precisa no regimento e a indumentária de um assessor se transformarem no que sobra do que devia ser uma luta emancipatória. Tudo demasiado pessoal."

Daniel Oliveira
Expresso