quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

UM IMENSO ADEUS


«Vagas vozes soavam distantes, e, por entre elas, um rádio, ou mais que um, gralhava. Era numa taberna, dentro da qual muita gente se acumulava ouvindo-o, que estava o mais próximo. Eu, no mesmo passo distraído em que vinha, derivei para a porta. A voz, rouca e excitada, dirigia-se violentamente aos inimigos da civilização cristã, exortando-os a deporem as armas, antes que fossem aniquilados pelas forças conjugadas do nazi-fascismo, increpava a França e a Inglaterra, com ironias que se faziam ainda mais roufenhas do que a voz, pela tibieza e a duplicidade com que agiam, manietadas pelas traições da democracia judeo-comunista, e trilava, em estridências não menos roucas mas mais trémulas, para informar os heróicos defensores do Alcázar de Toledo que estivessem seguros de que o mundo lutava em espírito ao lado deles, pois que, nessa mesma tarde, embora a informação não fosse oficial, o Governo Português oferecera, respondendo às provocações de que era objecto, o seu apoio incondicional ao general Mola, um dos gloriosos chefes da revolução libertadora. A presciência política do chefe do Governo, desse português da têmpera do Condestável Nuno Álvares Pereira e do Infante D. Henrique, porque, como o primeiro salvara a pátria na hora do perigo, e como o segundo pusera-a no caminho dos seus altos destinos, que era o das caravelas que afoitamente penetravam no Mar Tenebroso da decadência das nações entregues ao banditismo vermelho, essa presciência, essa sabedoria haurida nas mais fundas fontes da nacionalidade, não precisara de esperar pelo formalismo de um governo espanhol, para declarar-se à face do mundo, visto que, na guerra santa, o Governo estava na indestruti...tili...tiri...tibilidade - concluiu triunfantemente - da união das armas e dos corações. E, já num grasnido engasgado de tosse, acrescentou ainda: - Heróicos cadetes de Alcázar, flores da juventude da Espanha, podeis dormir descansados, com as cabeças pousadas nas vossas armas devotadas. Como as vossas sentinelas que assistem de olhos esbugalhados à destruição bárbara da vossa catedral em que jaz um rei de Portugal, mas que velam, Salazar está convosco. Ele vela, ele vela! Morte aos inimigos da nossa pátria.»