sábado, 20 de fevereiro de 2021

O MARCELO E O MARCELINO


 Ponto prévio: tenho, sempre tive, em muito mau conceito os patrioteiros Salazaro-marcelistas que se obstinaram em defender o "Portugal do Minho a Timor". Foram (são) estúpidos e ignorantes, sendo que alguns acumularam as duas "qualidades".

Com efeito, bastava ter uns breves e rudimentares conhecimentos de história para se saber que, após a segunda guerra mundial, os países imperialistas europeus se viram obrigados a reconhecer a independência das suas antigas colónias. Fizeram-no, quase sempre, através de negociações, mais ou menos complexas, mais ou menos demoradas, que evitaram situações de guerra. A França e a sua elite imperialista bem tentaram fazer parar o rio da História, construindo barragens de artilharia e de todas as outras armas ao seu alcance. Pagaram caro: saíram derrotados e humilhados da Indochina, nos anos 50 do século passado, e da Argélia, na década seguinte. E, praticamente, no mesmo momento em que a França se retirava da Argélia, Salazar, o fedorento e retrógrado hortelão de Santa Comba que os militares levaram ao colo até S. Bento, gritava bem alto, com a sua voz entre o falsete e o amaricado:"Para Angola, rapidamente e em força". Começava a guerra colonial, o maior crime do século XX português, que custou ao país 10.000 mortos, 30.000 feridos e um número indeterminado de stressados de guerra.

E aqui terminam "os previamentes" e começam "os finalmentes": os neofascistas, os seus 'compagnons de route' e os idiotas úteis, como qualquer bando de abutres que se preze, estão a explorar o morto Marcelino da Mata com o mesmo despudor com que o exército colonial-fascista explorou o Marcelino da Mata vivo.

Conheço, de ouvir contar, os feitos e a lenda do pobre Marcelino da Mata desde 1971. Porém, devo dizer que as aventuras do bravo, 'heróico' e condecoradíssimo militar podem ser boa matéria para um álbum de família ou para umas páginas da pequena história dos comandos-cruzados, mas a mim interessam-me muito pouco.

O que é importante neste caso e em muitos outros (como Wiriamu, por exemplo) é saber o nome dos que, entre 1961 e 1974, no Governo, no Comando-Chefe da Guiné e no seu Estado-Maior conceberam, planearam e mandaram executar as mais de duas mil acções em que participou o Marcelino da Mata, e depois o encheram de condecorações. Sim, porque não foi um simples contra-guerrilheiro quem decidiu operações no Senegal ou a invasão da Guiné-Conacri ou, sequer, as 'operações de limpeza' onde a ordem era para matar tudo o que mexesse - galinhas, cabras, porcos, velhos, mulheres, crianças. O bravo Marcelino da Mata morreu com as mãos manchadas de sangue, mas ainda cá estão muitos, igualmente com as mãos cheias de sangue, que bateram palmas à passagem do cortejo fúnebre. Pena que um betinho de Cascais que, por inerência, é comandante Supremo das Forças Armadas tenha juntado as suas mãozinhas imaculadas e bem tratadas a creme Nívea aos aplausos da fascistagem. Deus lhe perdoe, porque ele sabe muito bem o que fez. Quanto aos deputados que aprovaram um voto de pesar, que Deus os pordoe igualmente porque, esses, com raras excepções, não sabem o que fizeram, coitados.