Costa quebrou o “pacto de silêncio” do Estado sobre os crimes da guerra colonial
"Foram precisos quase 50 anos de democracia para que o Estado português viesse reconhecer, perante Moçambique, o “acto indesculpável que desonra a História” de Portugal, que foi o massacre de Wiriamu, um dos acontecimentos mais vergonhosos da guerra colonial.
"A declaração do primeiro-ministro na sua visita a Moçambique é, por isso, histórica. “Neste ano de 2022, quase decorridos 50 anos sobre esse terrível dia 16 de Dezembro de 1972, não posso deixar aqui de evocar e de me curvar perante a memória das vítimas do massacre de Wiriamu, acto indesculpável que desonra a nossa História.”
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"Hoje, parece-me quase do outro mundo aquela visita de Estado do Presidente da República a Moçambique, no ano de 2008, em que Cavaco Silva ficou quase em estado de choque quando lhe perguntei se tencionava pedir desculpa pelo massacre de Wiriamu. Cavaco estava ao lado do então Presidente moçambicano Armando Guebuza, esbugalhou os olhos, recusou pedir desculpa e desatou a contar os momentos felizes que passou em Moçambique quando, enquanto jovem alferes, esteve mobilizado para a guerra colonial: “Eu que estive aqui nesse tempo, apesar de já haver alguma instabilidade, nem isso me levou a ficar preso em Maputo [onde ficou colocado em funções administrativas]. Agarrei num carro e desbravei África.”
"Nesse dia, em Maputo, tive vergonha do meu país. Ao assumir que Wiriamu foi “um acto indesculpável que desonra a nossa história”, António Costa dá um passo fundamental para quebrar a “omertà” que o Estado construiu em torno da guerra colonial."
Ana Sá Lopes
Público