quarta-feira, 10 de maio de 2023

O ELOGIO DOS CHULOS

Público

 Finalmente, os cânones do neoliberalismo estão a fazer o seu glorioso caminho e, pouco a pouco, a ganhar o estatuto de cidade.

De facto, aqueles que, em linguagem antiquada e injusta, sempre foram designados por 'chulos', são, na verdade, empresários em nome individual que vêem nas actividades de perna aberta uma boa oportunidade de negócio. São indivíduos com apurado espírito de iniciativa que comparam, e bem, os braços dos imigrantes do Indostão explorados lá nas estufas de Odemira às pernas abertas das ruas, bares e pensões rascas do Cais do Sodré. A sua actividade comercial contribui, como qualquer outra, para o crescimento da economia nacional, para a melhoria do rácio Dívida/PIB, para a descida das taxas de juro e, por essa via, para o notável e louvado desempenho do ministro da Fazenda. E poderíamos acrescentar outras vantagens, como o alívio e consequente bem-estar dos fregueses em geral, aumento das exportações por prestação de serviços complementares ao sector do turismo e, até, o fortalecimento dos nossos laços com a organização militar a que pertencemos, quando os vasos de guerra da NATO nos visitam e despejam milhares de marujos nas praças e ruas da ex-capital do Império onde procuram as delícias da nossa mão-de-obra especializada.    

O reconhecimento da utilidade pública deste grupo de abnegados cidadãos, tão injustamente vilipendiados durante séculos, só peca por tardia. Congratulemo-nos, pois, e demos vivas ao neoliberalismo que nos indica o caminho da salvação.