domingo, 3 de março de 2019

E QUE TAL EMBARGAR A OBRA DO MOURA DESEMBARGADOR?

Ficou provado no processo que, desde 2013 até meados de 2017, pelo menos uma vez por semana, após o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, o arguido dizia, aos gritos, que a mulher era uma puta, uma vaca, que só tinha amantes, porca e que ela não valia nada” e, por vezes, também berrava: “eu mato-te!. Ficou igualmente provado que, durante o referido período, em momentos não concretamente apurados, o arguido agrediu fisicamente a mulher mediante bofetadas, que a atingiam na cabeça e membros superiores, ao mesmo tempo que a insultava, resultando para a mulher hematomas, edemas, escoriações e dores. Ficaram também provadas as ameaças com um objecto – eventualmente uma pistola -, os murros que perfuraram o tímpano da mulher e as ameaças com uma catana.
Para Neto de Moura, contudo, a única situação, devidamente concretizada de violência física foi aquela em que o arguido desferiu vários socos na mulher atingindo-a nas diferentes zonas da cabeça, incluindo os ouvidos, provocando-lhe perfuração do tímpano esquerdo. E acrescenta, lapidar: "todas as outras situações são de ofensas verbais e ameaças”. As bofetadas, ao longo dos anos, terão sido verbais? E os hematomas, edemas, escoriações e dores, terão sido o resultado das ofensas verbais ou das ameaças?
Ou ainda: a certa altura, o desembargador Neto de Moura afirma que se, em tempos, a violência doméstica era desvalorizada, actualmente “têm-se acentuado os sinais de uma tendência de sentido contrário, em que a mais banal discussão ou desavença (dentro do casal) é logo considerada violência doméstica”. Para demonstrar esta tendência acrescenta Neto de Moura: “Repare-se que, neste caso, está descrito como um acto de violência doméstica sobre a mulher o facto de o arguido, na presença dela, se queimar com cigarros e cortar-se “para demonstrar que não tinha medo de morrer”. Isto é, para Neto de Moura o facto de alguém se cortar e se queimar com cigarros perante o companheiro para demonstrar que não tem medo de morrer, faz parte de uma banal discussão ou desavença dentro do casal.

Francisco Teixeira da Mota
Público