Por muito tremidas que as coisas andassem, podia sempre olhar para a dimensão da corrupção no Brasil e consolar-me que, pelo menos, não somos brasileiros. Agora acabou-se. A Operação Tutti-Frutti parece um tudo-em-um: tem "Rachadinha", nos avençados que não trabalham e entregam parte da prebenda ao cacique do partido. Tem "Mensalão", no "acordo de governação com tachos por fora", com que se compra paz e governabilidade na capital. O paralelismo maior nem é brasileiro, é com o caso Gürtel espanhol, nos contratos públicos (ou "para-públicos") a empresas amigas do partido, como o do campo de rugby do Belenenses.
Mas o pior, claro, é o que o caso tem de mais português. A Tutti-Frutti é um retrato da corrupção (senão penal, seguramente ética e política) que se instalou no centro do regime e é transversal aos maiores partidos (a pista está no nome). Vê-se na distribuição de lugares públicos (com funções reais ou fictícias), no tráfico de influências que cobra comissões por abrir portas, nos contratos dos municípios ou Juntas de Freguesia do PS e PSD, nos pactos de conluio eleitoral para que todos possam "comer", nas lógicas de captura do aparelho e pagamento de quotas para ganhar eleições no partido. E vê-se na inércia que comanda um processo parado há anos, sem sequer interrogar os suspeitos. Não somos o Brasil? Pois não: no Brasil houve investigações, acusações e julgamentos.
João Paulo Batalha
Sábado